A indústria da música está travando uma batalha épica com o YouTube, o mais popular serviço de vídeo sob demanda, por causa dos royalties cada vez menores que ele paga e de uma suposta dificuldade para detectar conteúdo protegido por direitos autorais, em meio à massa de vídeos publicados no seu site.
O YouTube oferece voluntariamente às gravadoras um sistema para automaticamente bloquear, monetizar ou tirar o som de vídeos com suas músicas, identificando os arquivos de áudio com 99,7% de precisão, afirma o serviço. Ele também dá a elas uma chance de ganhar dinheiro com vídeos postados pelos usuários, em vez de simplesmente enviar notificações para a retirada do material.
Mas muitos detentores de direitos musicais dizem que o sistema do YouTube não é infalível e exige uma busca manual trabalhosa e diária para monitorar conteúdo e coletar royalties. Eles temem que o YouTube, com as taxas mais baixas que paga pela música, ganhe uma vantagem injusta sobre outros serviços de “streaming” por demanda, como Spotify e Apple Music. Esses serviços pagam bem mais por execução, mas juntos possuem um número de assinantes relativamente menor, 68 milhões, segundo o relatório mais recente da Federação Internacional da Indústria Fonográfica.
A indústria da música acredita que seu futuro está nos serviços de streaming, não no YouTube, que ela receia que esteja condicionando os fãs a não pagarem pelas músicas sob demanda.
Mas o YouTube, uma unidade da Alphabet Inc., com seus mais de 1 bilhão de usuários, possui uma influência e um alcance que o setor não pode ignorar. O YouTube afirma ter pago cerca de US$ 3 bilhões a empresas de música desde que foi criado, há dez anos, e hoje metade de sua receita vem do conteúdo gerado por usuários e identificado por seu sistema, o Content ID.
Embora o total desembolsado pelo serviço de vídeo aumente a cada ano, ele paga uma média de oito centésimos de centavo de dólar (US$ 0,0008) por execução e menos de seis centésimos de centavos de dólar (US$ 0,0006) por conteúdo gerado por usuários, uma queda de cerca de 20% em relação a um ano atrás, dizem pessoas a par do assunto.
Já as versões gratuitas dos serviços de streaming SoundCloud e Spotify pagam até seis vezes mais que o YouTube para vídeos postados por usuários, diz um dono de direitos autorais. Outro diz receber, em média, 35% a mais por execução (US$ 0,0011) desses serviços gratuitos do que dos vídeos do YouTube. As versões por assinatura dos serviços pagam ainda mais.
No centro da disputa está o sistema Content ID, que o YouTube criou há nove anos, numa tentativa de transformar vídeos postados por usuários em uma oportunidade de negócio para os detentores de direitos autorais e, ao mesmo tempo, dar impulso à sua própria receita publicitária. O YouTube afirma que o Content ID funciona de forma quase perfeita para ajudar as gravadoras a proteger sua música e lucrar com ela.
Mas muitos na indústria da música dizem que o sistema não identifica automaticamente muitas das gravações quando os usuários alteram ou combinam músicas — ou, às vezes, até sem nenhuma razão aparente. Além disso, as gravadoras alegam que o Content ID não analisa os canais do YouTube gerenciados por grandes redes de TV e redes menores, como Fullscreen e Awesomeness TV, muitas das quais exibem amadores interpretando canções populares.
Alguns executivos de gravadoras dizem que o sistema apenas detecta cerca de 50% de suas músicas, forçando-os a procurar manualmente por vídeos postados por usuários. Em média, a indústria da música envia cerca de 2 mil reivindicações por dia de vídeos descobertos manualmente, afirma o YouTube.
A Sony Music Entertainment, da Sony Corp., afirma que, desde dezembro de 2012, suas buscas manuais levaram a reivindicações de 1,5 milhão de cópias de suas gravações que infringiram direitos autorais no YouTube sem terem sido identificadas pelo Content ID. Se não tivesse descoberto esses vídeos, a Sony afirma que teria perdido US$ 7,7 milhões em receita.
O YouTube pode criar um sistema capaz de bloquear mais violações de direitos autorais. “Não é mais um problema tecnológico”, diz Vance Ikezoye, um dos fundadores de um sistema de filtragem de áudio, o Audible Magic, que o YouTube contratava até 2009. Uma porta-voz do YouTube diz que o sistema já tem uma precisão de 99,7%.
Harris Cohen, gerente sênior de produto do Content ID, diz que seu sistema tem que “encontrar um equilíbrio” entre os interesses dos donos de conteúdo e dos usuários, que geram a maior parte de sua receita de publicidade e que podem estar usando os trabalhos com direitos autorais de forma justa em seus vídeos — por exemplo, como uma incidental música de fundo ou em algum outro contexto criativo. “Há um nível de trabalho e envolvimento que realmente é exigido para esse equilíbrio”, diz Cohen.
Antes do Content ID, as gravadoras não conseguiam ganhar dinheiro com vídeos publicados por usuários no YouTube e que tocavam as suas músicas. Elas apenas podiam enviar “notificações de retirada” para que o YouTube removesse os vídeos.
O YouTube afirma que investiu US$ 60 milhões para construir seu mecanismo de filtragem e que está melhorando o serviço com o tempo. A maioria das reivindicações de direitos autorais feitas pelos 8 mil usuários do Content ID resulta desse processo automatizado, mas 0,5% delas é feita em vídeos que o sistema não identifica.
Menos de 1% das reivindicações apresentadas por meio do Content ID são contestadas pelos usuários que postaram os vídeos, segundo o YouTube. Mesmo nesses casos, as gravadoras podem exigir que os vídeos sejam removidos.
Executivos do setor também estão entrando na briga, como o superempresário Irving Azoff e artistas como Taylor Swift e U2, que pediram ao Congresso americano para mudar a lei que protege sites como o YouTube da responsabilidade de hospedar música publicada por usuários sem permissão.